Depois da consagração de Ainda Estou Aqui, de Walter Salles, no Oscar deste ano, o cinema brasileiro mantém seu ótimo momento com uma safra de ótimos títulos, algo que não acontecia desde a década de 2000. E capitaneando a nova leva de produções está O Agente Secreto, o premiado filme do cineasta Kleber Mendonça Filho, que estreia nesta quinta-feira (6) cercado de grandes expectativas de público e com um lançamento em cerca de 700 salas do país.
Vencedor das categorias melhor
diretor e melhor ator para Wagner Moura no Festival de Cannes deste ano, além
do prêmio da crítica no mesmo evento, a produção foi selecionada pelo Brasil para
tentar uma vaga na categoria filme internacional no Oscar 2026. Mas podem
acontecer mais indicações segundo as cotações de vários veículos internacionais
que cobrem cinema – ator para Wagner Moura, direção para Kleber e melhor filme.
A repetição da vitoriosa campanha do filme de Salles vai depender do trabalho que
já está sendo realizado pela equipe de O Agente Secreto juntamente com seus produtores – o filme é uma coprodução com Alemanha, França e Holanda – e distribuidores.
O Agente Secreto é o sexto longa-metragem do diretor pernambucano – depois de Crítico, O Som ao Redor, Aquarius,
Bacurau (este com direção dividida com Juliano Dornelles) e Retratos Fantasmas –
e seu trabalho mais consistente. A história criada por Mendonça é ambientada no
período de carnaval de 1977, no Recife, cidade para onde retorna o personagem
Marcelo (Moura), codinome do pesquisador científico e professor universitário Armando.
O clima é de tensão em plena ditadura – palavra que não é mencionada em nenhum
momento da produção – militar no Brasil,
percebido na cena inicial com o protagonista sendo abordado por policiais
rodoviários em um posto de gasolina na estrada. Marcelo está fugindo e pretende
se exilar do país juntamente com o filho, que está morando com os avós após a
morte da mãe.
Com esmero, o diretor vai esmiuçando
os motivos de sua perseguição e revelando os outros personagens da trama. Gente
como dona Sebastiana – a sensacional Tânia Mara, artesã de profissão revelada
com atriz ainda como figurante de Bacurau –, que ajuda a abrigar pessoas como o
próprio Marcelo, Claudia (Hermila Guedes, de O Céu de Suely) e a angolana
Tereza (Isabél Zuaa, de As Boas Maneiras) e seu marido, que “precisam ser
protegidas do Brasil”, como afirma Elza, personagem de Maria Fernanda Cândido (de
A Paixão Segundo G.H.). Ela é a líder de um grupo que financia e ajuda os
perseguidos pela ditadura brasileira e por quem a apoia e se beneficia dela,
como o corrupto empresário Ghirotti (Luciano Chirolli), responsável por enviar
a dupla de assassinos profissionais Augusto (Roney Villela) e Bob (Gabriel
Leone, de Eduardo e Mônica) para eliminar Marcelo. Há também o delegado
Euclides (Robério Diógenes) e seu filhos, também representantes do poder
ameaçador sobre o cidadão comum em uma das épocas mais sombrias do Brasil.
O thriller psicológico traz
uma sensação crescente de medo, mas Mendonça desafoga a trama em momentos mais
tranquilos, mostrando a relação de Marcelo com o filho, os sogros e também seu
breve envolvimento com Claudia, além da relação entre os perseguidos abrigados por dona Sebastiana. O diretor ainda destaca o realismo fantástico
da lenda da “perna cabeluda”, que faz parte da mitologia da capital
pernambucana – lembrada em músicas dos grupos Chico Science & Nação Zumbi (“Banditismo
por uma Questão de Classe”) e mundo livre s/a (“Roendo os Restos de Ronald
Reagan”) – e que aparece em uma divertida sequência do filme. Mendonça também
reafirma sua ligação com o cinema, como já havia feito em Retratos Fantasmas,
seu longa anterior, fazendo do Cine São Luiz, no centro do Recife, novamente um
marco importante para a história que quer contar.
O Agente Secreto conversa com
Ainda Estou Aqui em alguns aspectos, revelando um período nefasto da história
brasileira que muitos se dizem saudosos sem na realidade saber exatamente o que
se passou. E também reafirma a importância da memória, de lembrar o passado para
que a violência e os erros cometidos não se repitam, para tentar mudar a
história, mesmo que muitos desejem deixar tudo como sempre foi.
Por fim, vale celebrar a
atuação de Wagner Moura, novamente brilhante, mas diferente de outras
intepretações marcantes de sua carreira. Assim como Fernanda Torres em Ainda
Estou Aqui, o ator baiano trabalha nos gestos contidos e na força do olhar, que
em todos os momentos revelam calma, mas também toda a tensão e medo pelos quais
passa seu personagem. Cotação: Ótimo.
Trailer de O Agente Secreto:
Crédito da foto: Divulgação/Vitrine
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