Almodóvar fala de eutanásia em O Quarto ao Lado, FILMES, por Rudney Flores


 Um dos mais cultuados cineastas do mundo, Pedro Almodóvar apresentou este ano O Quarto ao Lado, seu primeiro longa-metragem totalmente falado em inglês. Premiado em setembro como melhor filme do importante Festival de Veneza, um dos principais termômetros do Oscar nos últimos anos, a produção está sendo lançada nesta quinta-feira (24) no Brasil. Em sua estreia nos Estados Unidos, o diretor espanhol conseguiu a parceria de duas estrelas oscarizadas, Julianne Moore (vencedora de atriz principal por Para Sempre Alice) e Tilda Swinton (melhor atriz coadjuvante por Conduta de Risco), que vivem, respectivamente, as amigas Ingrid e Martha, que se aproximam por causa de uma doença terminal da última. 

Em uma tarde de autógrafos de seu mais recente livro, em Nova York, a jornalista e escritora Ingrid fica sabendo que Martha, uma premiada fotojornalista, tem câncer, e decide visitá-la depois de muitos anos sem se verem. Após um breve tempo de convívio, no qual relembram algumas aventuras, Martha faz uma proposta surpreendente para Ingrid, pedindo que a acompanhe em uma viagem para uma casa afastada, onde pretende cometer suicídio com uma droga proibida, pois não suporta mais o tratamento da doença, que não tem dado mais resultado. A amiga ficaria no quarto ao lado do título, e trataria dos trâmites quando morresse. A personagem de Moore, que havia revelado justamente no livro lançado seu medo da morte, hesita, mas decide atender o desejo da antiga companheira de trabalho e boas lembranças.

O diretor iniciou a carreira nos anos 1980 com divertidas e alucinantes comédias (O Que Eu Fiz para Merecer Isto?, Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos, Ata-me) e atingiu seu auge no final dos anos 1990 início dos anos 2000 com cinco belos filmes, todos melodramas muito bem realizados (A Flor do Meu Segredo, Carne Trêmula, Tudo Sobre Minha Mãe, Fale com Ela e Volver). Depois, houve um leve declínio, com alguns filmes até bons, mas não tão inspirados. O cineasta voltou à boa forma apenas em 2019, com o semibiográfico e belo Dor e Glória, que deu a Antonio Banderas sua primeira indicação ao Oscar. Assim como Mães Paralelas (2021), O Quarto ao Lado reflete este novo bom momento da trajetória do cineasta, apesar de poder ser considerado mais frio do que suas demais produções.

Almodóvar não domina a língua inglesa e criou o roteiro em espanhol – baseado no livro O Que Você Está Enfrentando, de Sigrid Nunez –, e, possivelmente, algo pode ter se perdido na tradução. Algumas características tradicionais de seu cinema estão presentes – o foco feminino, as famosas "cores de Almodóvar" –, mas este novo melodrama segue linearmente, de forma correta e segura, sem maiores atrativos no texto sobre amizade e eutanásia. Há leves toques de humor ácido e acenos para temas atuais, como a crise ambiental do planeta, o crescimento da extrema direita ou da quase proibição do toque entre as pessoas (que pode ser interpretado com assédio), os quais não têm grande desenvolvimento, além de uma surpresa visual na parte final da trama, que poderia ter causado um efeito mais interessante se fosse melhor explorada.

O que se destaca mesmo é o trabalho sempre competente de Julianne Moore e Tilda Swinton, que já estão nas listas de possíveis indicadas ao Oscar, ao que se junta ainda uma discreta e boa participação do ótimo John Turturro (Barton Fink – Delírios de Hollywood). Cotação: Bom.

 

Trailer de O Quarto ao Lado:

 


 

Crédito da foto: Warner Bros. Pictures Brasil