Peça Subterrânea tem minitemporada no Espaço Obragem

 


A atriz mineira, radicada em São Paulo, Juliana Birchal e sua equipe de produção apresentam, de quinta-feira (27) a sábado (1º/3), sempre às 20 horas, o solo autoral de teatro físico Subterrânea: Uma Fábula Grotesca

A peça, já apresentada em Londrina, Maringá e Piraquara, é realizada por meio da Bolsa Funarte de Teatro Myriam Muniz. “Trazer o espetáculo para cidades paranaenses é uma oportunidade de compartilhar com um público inédito, o que com certeza vai acrescentar muito ao nosso trabalho, além da troca com artistas locais e colocar em pauta a violência de gênero, um tema urgente”, destaca Juliana. 

O projeto também traz ações de acessibilidade com apresentações em Libras, audiodescrição e também visita tátil ao cenário para pessoas cegas e com baixa visão, uma hora antes das apresentações. "Dessa forma, aproximamos todos os públicos da arte e também da relevância do tema que trazemos no texto”, completa a atriz. 

Por meio de uma fábula, o solo Birchal coloca em cena uma mulher-cigarra que, para se encaixar nos papeis sociais que lhe foram atribuídos, acaba revelando as contradições e violências deste sistema, sendo ao mesmo tempo vítima e algoz. “O espetáculo questiona a perpetuação de modelos sociais e valores morais provocando o público a refletir sobre o lugar das mulheres na sociedade”, enfatiza ela. 

Na equipe criativa de Subterrânea, Juliana conta com a direção de Lenine Martins e utiliza a técnica teatral do mascaramento para viver a personagem, uma mulher-cigarra que levanta questionamentos sobre o patriarcado ao fazer uma analogia com o ciclo de vida do inseto que passa parte da vida debaixo da terra. “A correlação com a cigarra convida o público a refletir sobre as funções e papeis exercidos pela mulher na sociedade e o afloramento do conservadorismo na contemporaneidade que acaba por justificar erroneamente uma série de injustiças comumente aceitas”, revela.

Do ponto de vista da linguagem, a produção parte da investigação estética da atriz sobre corpos-máscaras para dar vida à mulher-cigarra e outros insetos que participam da narrativa. De acordo com Juliana, o ciclo de vida da cigarra dialoga com a "mulher de bem" que está inserida no sistema de poder. “Trata-se de uma metáfora incrível com tudo o que eu me proponho a falar sobre o conservadorismo que sempre esteve aí e que emerge de uma forma muito violenta”, confirma.

A investigação também se associa à pesquisa de Mestrado desenvolvida por Juliana na ECA/USP intitulada “Da máscara à maquiagem: o mascaramento no Théâtre du Soleil, seguido de estudo de caso do espetáculo A Era de Ouro (1975)”, no qual analisa os mascaramentos adotados pelo Théâtre du Soleil, trupe francesa com a qual realizou residência artística, entre 2014 e 2016.

No palco, o público pode acompanhar exatamente o ciclo de vida da cigarra, que pelo bem da espécie, repete o próprio sistema que a reprime, mantendo assim, a ordem natural das coisas, acreditando que a sobrevivência depende do cumprimento das obrigações que o próprio sistema impõe, quando se compara que a cigarra pode viver por até 17 anos debaixo da terra e, ao sair, cumpre sua última metamorfose. “É nesse momento que acasala, reproduz e morre”, completa Juliana. 

Ela conta que foi impactada pela leitura de As Aventuras de Alice no Reino Subterrâneo, obra consagrada de Lewis Carroll, escrita em 1865, mais conhecida como Alice no País das Maravilhas. Em 2019, convidou a atriz Mayara Dornas para montar um espetáculo a partir daquela narrativa. “Lembro de estar muito interessada nesse mergulho que a Alice faz no mundo subterrâneo e aí comecei a pesquisar a obra e ficar curiosa sobre o que era esse salto que ela dá, para esse lugar debaixo da terra, onde a lógica parece não ter lógica”, explica. 

Outro ponto de partida para a montagem foi o isolamento social vivenciado durante a pandemia da Covid-19. Diante da situação alarmante e da pulsante vontade de se expressar, a atriz transformou sua casa em uma sala de experimentos, que resultou no solo autoral. Ela conta que a ideia do subterrâneo já havia ultrapassado a história de Alice. “De repente, tudo que estávamos vivendo social e politicamente no Brasil, além de um governo de extrema direita e discursos de ódio ganhando força, começou a me trazer forte impacto, que transformei em arte”, conta. Foi nesse momento que a ideia do subterrâneo ganhou força revelando como aquilo que estava escondido se tornou visível de forma avassaladora. “Se antigamente alguém tinha receio de falar algo que pudesse soar como intolerante ou preconceituoso, naquele momento, as pessoas não o tinham mais e a justificativa era a liberdade de expressão”, destaca.


Serviço:

Subterrânea: Uma Fábula Grotesca 

Espaço Obragem (Al. Júlia da Costa, 204 – São Francisco)

De 27 de fevereiro a 1º de março (quinta-feira a sábado), sempre às 20h. Dia 28 de fevereiro (sexta-feira), apresentação com Libras e audiodescrição, e roda de conversa após o espetáculo.

Entrada gratuita.


Crédito da foto: Raquel Carneiro